domingo, 15 de agosto de 2010

Arte comunitária contra a violência sexual

Exploração sexual, abuso e tráfico de crianças e adolescentes são problemas que existem em todas as partes do mundo. E na Bahia, não é diferente. Mas esta realidade pode e já está mudando, graças ao maior envolvimento da sociedade nas discussões sobre estas questões.

Uma mostra disso pôde ser vista na tarde deste domingo, durante o Festival A Cidade CRIA Cenários de Cidadania. Jovens do grupo Realidade, da comunidade de Arenoso, e do grupo Sem Opressão, do bairro de Cosme de Farias, apresentaram duas esquetes teatrais sobre o tema tráfico de seres humanos, principalmente de crianças e adolescentes, para fins de exploração sexual.

“As esquetes são resultado de anos de vivência que os jovens tem tido no CRIA com ênfase nas artes comunitárias e nos direitos das crianças e adolescentes”, diz Irene Piñero, coordenadora da área de saúde do CRIA.



A diretora do grupo Realidade, Uiara Gonçalves, é um exemplo disso. “Sou cria do CRIA. A gente ensina o que aprende no CRIA”. O grupo, criado há um ano e meio reúne jovens de 12 a 18 anos e trouxe para o festival uma esquete sobre o problema do tráfico humano e da exploração sexual de crianças, com elementos da música e da dança. “Para mim é uma honra esta aqui hoje, pois já fui platéia e hoje faço parte do festival”.

Um dos momentos mais aguardados do festival são os debates. O da tarde deste domingo contou com a presença de duas convidadas que já são parceiras de longa data do CRIA, na área de direitos sexuais e reprodutivos, a socióloga Marlene Vaz e a diretora do Instituto Winrock, Débora Aranha.

Consultora do CRIA desde 1996, Marlene reconhece na atuação do CRIA um trabalho fundamental para conscientização dos jovens para a questão da violação de direitos. “O CRIA hoje é a organização mais importante do país na questão da prevenção da violência física e sexual contra a criança e o adolescente. O trabalho desenvolvido é diferente pois faz a inclusão pela arte em várias vertentes, como a saúde.” Como ela mesmo diz, o CRIA usa a arte como código para falar de várias questões ligadas aos direitos do jovem e do adolescente..



Mas para mudar esta realidade por completo, ela dá algumas sugestões para que as políticas públicas de proteção à criança e ao jovem sejam mais eficazes, tais como o maior apoio técnico a estas políticas que são aplicadas com recursos governamentais, a melhor qualidade no acolhimento das vítimas do abuso e da exploração, expandir e estruturar bibliotecas nos postos de combustíveis para estimular a consciência dos caminhoneiros e avaliação das campanhas. Um exemplo é um dado da pesquisa sobre os caminhoneiros e a exploração sexual de meninas desenvolvida por ela. “Os caminhoneiros sabem da existência do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), mas não conhecem os direitos das meninas e assim não podem respeitá-las”.

Presentes desde o início do festival, os representantes do Quilombo de Tijuaçu e da tribo Pataxó de Coroa Vermelha dão a tônica da diversidade deste festival e disseram também como a questão da violência sexual está presente em suas comunidades. “A gente fica preocupado porque nossas crianças ficam vulneráveis. Além disso, os estrangeiros se aproximam da gente atraídos pela beleza das índias e continuam o massacre que começou no passado. Com a ajuda do CRIA, aprendemos a perceber e a evitar isso”, disse o jovem pataxó Ubiraí.

Além de trazer toda sua sabedoria e tradição do samba de lata para o festival, a mestra popular quilombola Detinha, de Tijuaçu, fez um alerta aos jovens e contou sua experiência do risco que correu. “Quando tinha dez anos ia lavar roupa no rio e pegava carona de madrugada com caminhoneiros. Eu me sentia atraída por eles, mas graças aos conselhos dos pais e amigos eu não caí nessa”.

Para Alef Ramom Silva, jovem ator do grupo Pessoa Comum do CRIA, a sociedade não deve ficar calada diante dos casos de violência contra a criança e adolescente. “Quem é pai ou mãe deve ficar atento, ver o olhar da criança e perceber o modo de agir dela depois que acontece. Vamos abrir o olho e ver o que a gente pode fazer para melhorar esta situação no Brasil”.